Por que filhos de pais desnutridos têm mais risco de problemas na escola?
A desnutrição pode ser passada de geração em geração. Entenda como isso acontece e o que pode ser feito para quebrar esse ciclo.

Desnutrição pode ser herdada?
Sim. Quando uma mulher grávida está desnutrida, os efeitos não afetam só ela. O bebê que ela carrega pode ter seu crescimento e desenvolvimento cerebral prejudicados. Isso cria um ciclo intergeracional da desnutrição — quando pais desnutridos têm filhos com maiores riscos de também sofrerem com a desnutrição.
A desnutrição pode ser passada de geração para geração, tanto pelo corpo quanto pelas condições sociais em que a criança nasce.
Durante a gravidez, o bebê é muito influenciado pelos nutrientes que recebe. Se a mãe não se alimenta bem, o cérebro do bebê pode não se desenvolver como deveria. Essa situação também afeta o futuro da criança: ela pode ter dificuldades na escola, menor rendimento e até menor renda na vida adulta.
Como o corpo guarda essa “memória” da desnutrição?
Nosso corpo tem uma espécie de “memória biológica” que pode ser influenciada pela alimentação da mãe na gravidez. Cientistas chamam isso de programação metabólica. Isso quer dizer que, se o bebê passa por falta de nutrientes ainda na barriga, seu corpo e seu cérebro podem se desenvolver de forma diferente, o que afeta sua saúde por toda a vida.
Pesquisas mostram que essa influência pode acontecer mesmo sem mudar o DNA. São mudanças no jeito como os genes funcionam — chamadas de alterações epigenéticas — e que podem durar a vida toda. Em alguns casos, essas alterações passam para os filhos e até netos (1, 2).
Quando a pobreza alimenta a desnutrição

Além da parte biológica, o ciclo da desnutrição também é reforçado por questões sociais. Veja alguns exemplos:
- Pobreza: famílias com histórico de desnutrição têm mais chances de continuar vivendo com pouca comida ou alimentos de baixa qualidade (4);
- Baixa escolaridade: quanto menos a mãe estudou, maiores as chances de a criança ter problemas de nutrição (5);
- Falta de saneamento: diarreias frequentes e infecções intestinais prejudicam a absorção dos nutrientes, mesmo quando a alimentação parece adequada (6).
👉 Cada ano a mais que uma mãe estuda reduz em até 5% o risco de desnutrição crônica nos filhos.
É possível quebrar esse ciclo?

Sim! Diversas iniciativas mostram que é possível interromper o ciclo da desnutrição com ações bem planejadas. Veja algumas:
- Transferência de renda: programas como o Bolsa Família ajudaram a reduzir em até 26% os casos de baixa estatura entre crianças beneficiadas (7);
- Criança Feliz: esse programa oferece visitas domiciliares com orientações sobre nutrição e cuidados com os filhos. Os resultados mostram melhora na alimentação e no desenvolvimento infantil (8);
- Primeiros 1000 dias: esse período — da gravidez até os 2 anos de idade — é o mais importante para o cérebro e o corpo da criança. Cuidar bem dessa fase tem efeitos positivos para a vida toda.
Outras estratégias importantes incluem:
- Apoiar o aleitamento materno exclusivo nos primeiros 6 meses;
- Ensinar boas práticas alimentares às famílias;
- Incentivar o empoderamento feminino — quando a mulher tem mais autonomia, ela costuma priorizar a saúde e a educação dos filhos.
👉 Quando a mulher é cuidada, informada e valorizada, ela quebra o ciclo da desnutrição — e cria uma nova história para seus filhos.
🧬 O que aprendemos hoje?

- A desnutrição pode ser transmitida de geração em geração, tanto por efeitos biológicos durante a gestação quanto pelas condições sociais em que a criança nasce.
- Alterações no corpo da mãe durante a gravidez, como a falta de nutrientes, podem afetar para sempre o desenvolvimento do cérebro e da saúde do bebê.
- Programas que combinam renda, nutrição, educação e apoio às mulheres são capazes de interromper o ciclo da desnutrição e mudar o futuro das famílias.
Aqui no Clube da Saúde Infantil, acreditamos: crescer com saúde é mais legal!
📚 Referências Bibliográficas
- Barker DJP, Thornburg KL. Clin Obstet Gynecol. 2013;56(3):511-519.
- Lillycrop KA, Burdge GC. Best Pract Res Clin Endocrinol Metab. 2012;26(5):667-676.
- Ministério da Saúde. Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher. 2020.
- IBGE. Pesquisa de Orçamentos Familiares 2017-2018. 2019.
- Victora CG et al. Lancet. 2008;371(9609):340-357.
- FIOCRUZ. Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil. 2019.
- Rasella D et al. Lancet. 2013;382(9886):57-64.
- Ministério da Cidadania. Avaliação de Impacto do Programa Criança Feliz. 2021.
- Black RE et al. Lancet. 2013;382(9890):427-451.